O primeiro chatbot — relato de uma experiência transformadora

Priscilla Santos Motta
5 min readFeb 24, 2021

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O início

Linguística e tecnologia. A primeira vez que me deparei com essa interdisciplinaridade foi na faculdade. Era o início dos anos 2000 e, na Universidade Federal do Rio de Janeiro, alguns alunos de mestrado do Centro de Tecnologia assistiam a aulas da pós-graduação de linguística. O que faziam? Nunca tive coragem de perguntar, afinal, engenharia e cálculo estavam além da minha capacidade cognitiva, julgava erradamente.

Apesar de não ter coragem de encarar a matemática (e a estatística) de frente, como sempre gostei de tecnologia, acabei dando um jeitinho de me envolver com ela. No mestrado, fui estudar prosódia, e usei programas para me ajudarem na análise dos dados, o que se repetiu no doutorado.

Além disso, sempre estive ligada ao ensino a distância, procurava estudar sobre tecnologia educacional, porém mais como curiosa e entusiasta do que como participante ativa. Sonhava em construir programas que me ajudassem a corrigir redação, mas e a capacidade técnica para isso? Sempre achei a programação algo inalcançável. Para completar, as oportunidades profissionais do ensino presencial sempre foram mais prósperas.

O tempo passou e vieram Siri, Alexa e outros assistentes virtuais, e eu pensei: entendi o que os engenheiros faziam na faculdade de Letras. Eu já estava conformada a ser espectadora da evolução da tecnologia quando veio a pandemia. Naquele momento, eu lecionava redação e fomos todos para as aulas on-line. O problema veio quando fomos, de máscara, para as aulas presenciais. Não me adaptei, não consigo falar, andar e usar máscara, tudo junto. Resumindo, fim de jogo para mim, simples assim.

Nessas condições, reformular a carreira tem sido a solução, então, pesquisa vai, pesquisa vem, conheci o universo da Experiência do Usuário (UX). “É isso!”, pensei. E, curso vai, curso vem, estou encantada com as possibilidades e, principalmente, feliz em ter encontrado, novamente, a junção entre tecnologia e Linguística.

Capacita MDT

O primeiro curso na área de UX que fiz foi o UX Writing do Aldeia.cc. Nele aprendi estratégias de escrita para sites, blogues e apps de organizações. Além disso, conheci que uma das atribuições desse profissional é cuidar do design conversacional de chatbots, o que me deixou totalmente fascinada.

A partir dessa informação, comecei a procurar cursos para me capacitar nessa área, pois a conversação e eu, na área da Linguística, já temos uma longa relação — de estudos de pós-graduação. E foi assim que encontrei o programa que tem mudado drasticamente a minha vida e de tantas outras mulheres, o Capacita MDT.

Essa iniciativa partiu de três empresas: Let’s Bot, D1 e Smarkio. Conforme apresentação da página da Lets Bot, esse é “um programa de capacitação para mulheres desempregadas ou em transição de carreira desenhado com o objetivo de prepará-las para trabalhar na área de tecnologia focada em chatbots e inteligência artificial”. Contamos, também, com a mentoria de colaboradoras da Smarkio, que nos ajudam a ter noção de como é o dia a dia de trabalho na empresa e na área. No final haverá um processo seletivo. O programa tem o seguinte desenho.

Disponível em https://letsbot.rocks/capacitamdt/.

Na primeira fase, foram 5 mil inscritas. Produzimos, em uma semana, nosso primeiro Chatbot. Foi incrível. De experiência zero com programação, ao fim desses cinco dias, aprendi o básico de J.SON e construí um chatbot no ALTU, tecnologia usada pela Smarkio na construção de assistentes virtuais.

Nesse tempo, trocamos experiências em um grupo no Telegram e construímos uma comunidade de aprendizagem colaborativa. Foi uma experiência fantástica e única. Tínhamos lives diárias e nos dedicamos muito ao processo. Ao fim, com documentação pronta e chatbot sendo “quebrado”, tivemos uma seleção, pois apenas 200 passariam para a fase Expert. Felizmente fui uma das selecionadas.

Trecho do e-mail que recebi.

O primeiro chatbot

Imagem do início da experiência de atendimento da Fê.

Conhecemos o ALTU no terceiro dia de curso e o briefing do chatbot no quarto, ou seja, tivemos um dia para fazer o chatbot. A primeira tarefa foi fazer a documentação, que foi um dos critérios usados na avaliação para a seleção da fase expert. Para a documentação, usamos o Miro.

O briefing foi o seguinte:

Chatbot para loja de roupas femininas

Bot com:

– Quem somos

– Produtos Mais vendidos:

– Produto 1 (Camiseta)

– Produto 2 (Relógio)

– Produto 3 (Óculos)

– Coleções.

Ao fim da quinta-feira, fizemos uma publicação no Linkedin, convidando nossa rede de contatos a interagir com nossos pequenos robôs. Foi com base nessas exigências que criei a Fê, a assistente virtual de uma loja especializada em produtos para corrida. Nesse primeiro momento, o bot contava com recursos simples, sendo apenas de fluxo. Na fase Expert, a Fê virou Dora, e já conta com NLU (tema de outro artigo), é híbrido — tem inteligência artificial.

Em razão do tempo que tivemos para desenvolver o bot, e por se tratar de um processo de seleção e eliminação, optei por não acrescentar recursos que não foram ensinados até então (como adicionar imagens). Segui a linha “menos é mais”. No Miro, a documentação ficou da seguinte forma, depois de aprimorada.

Documentação de fluxo conversacional — Miro.

E como isso funciona, afinal? Para saber como ficou a Fê, é só dar um play no vídeo.

E agora, José?

Em uma semana, ver um robô funcionando foi… sem palavras. Depois desse período intenso do Capacita MDT-Starter, seguimos na fase Expert. Agora, estamos aprendendo, também, sobre Scrum e trabalhamos por Sprints. Neste momento estamos na Sprint 3, e a cada dia a curva de aprendizagem só cresce, e isso é fantástico.

Além das competência técnicas, aprendemos, também, sobre o trabalho em equipe. Compartilhamos dúvidas, erros, acertos, cursos e eventos da área, e isso faz com que aprimoremos, também, soft skills, tão importantes para a realidade de hoje.

A cada momento, a tecnologia me fascina mais, e a relação entre essa e a Linguística fica mais incontestável em minha realidade. O sonho é encarar os desafios que a inteligência artificial impõe e conseguir fazer dos chatbots e da experiência do usuário áreas de atuação profissional. Aprender sempre, desistir jamais. E vamos com fé.

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Priscilla Santos Motta

Em constante aprendizado. UX Writer, designer conversacional e professora. Encantada por linguagem, tecnologia e chatbots.